O PRESENTE
Todas as vezes em que eu ia ao asilo fazer minha visita semanal, levava algumas coisas pedidas pelos velhinhos – claro que com autorização da coordenação. Para uns, levava livros; para outros, linhas, agulhas, tecidos e até brinquedos, como cubo mágico e palavras cruzadas. Mas havia uma senhora de seus aproximados oitenta e cinco anos que, ao ver-me chegar, saía de perto e voltava para seu quarto.
Como eu era voluntário ali, não deixava por menos: ia até a porta do quarto, batia, e a cumprimentava. Recebia sempre, como resposta, uma palavra malcriada, mas mesmo assim não desistia dela - antes de ir embora, dava-lhe adeus. Nunca deixei de fazer isso.
Certa vez, fiquei doente, com dengue - doença transmitida por mosquito, mas como não sabia do que se tratava receei que fosse algo contagioso e fiquei afastado do asilo. Ao ter um diagnóstico, já estava acamado. Sendo assim, fiquei três semanas sem visitar o asilo.
Ao retornar, os meus velhinhos estavam bem agitados, querendo saber o porquê de eu ter ficado tanto tempo sem visitá-los. Fui dando explicações enquanto distribuía os presentes que levara por minha conta, sem que eles houvessem encomendado, pois já sabia o gosto da maioria. De repente, uma voz forte e alta veio do corredor - NÃO VAI FALAR COMIGO, NÃO?
Assustado, olhei para aquela direção, e vi a minha amiguinha malcriada que, na agitação da chegada, eu não vira, esquecendo de ir cumprimentar. Apesar do tempo em que eu ficara afastado, ela tinha agido como sempre - ao ver-me entrar, fugira para o seu quarto.
Como eu era voluntário ali, não deixava por menos: ia até a porta do quarto, batia, e a cumprimentava. Recebia sempre, como resposta, uma palavra malcriada, mas mesmo assim não desistia dela - antes de ir embora, dava-lhe adeus. Nunca deixei de fazer isso.
Certa vez, fiquei doente, com dengue - doença transmitida por mosquito, mas como não sabia do que se tratava receei que fosse algo contagioso e fiquei afastado do asilo. Ao ter um diagnóstico, já estava acamado. Sendo assim, fiquei três semanas sem visitar o asilo.
Ao retornar, os meus velhinhos estavam bem agitados, querendo saber o porquê de eu ter ficado tanto tempo sem visitá-los. Fui dando explicações enquanto distribuía os presentes que levara por minha conta, sem que eles houvessem encomendado, pois já sabia o gosto da maioria. De repente, uma voz forte e alta veio do corredor - NÃO VAI FALAR COMIGO, NÃO?
Assustado, olhei para aquela direção, e vi a minha amiguinha malcriada que, na agitação da chegada, eu não vira, esquecendo de ir cumprimentar. Apesar do tempo em que eu ficara afastado, ela tinha agido como sempre - ao ver-me entrar, fugira para o seu quarto.
Caminhei em sua direção e falei – desculpe-me, já ia ao seu quarto falar com você. Ela deu-me as costas e disse que não precisava, pois ela já estava ali mesmo... Antes de entrar, porém, olhou para trás falando - NÃO VÁ ESQUECER, ENTÃO, DE SE DESPEDIR.
Sorri para ela e, ao sair, fiz o que costumava fazer e passei pelo seu quarto para a despedida, mas ela pediu-me para entrar. Mandou-me sentar e falou que gostava de mim e que agia daquela maneira, porque eu lhe lembrava seu filho.
Emocionado, eu disse que me sentia orgulhoso por me parecer com seu filho, mas ela disse que eu não me parecia com ele, pois ele não chegara a nascer, mas que eu era exatamente como ela desejaria que ele fosse, caso ela o criasse - um bom homem.
Senti-me mais emocionado ainda, e perguntei se ela queria conversar sobre o assunto. Ela respondeu que não tinha muito a falar, apenas que namorara um homem do qual engravidara. Com medo dos pais, fizera uma bobagem, recorrendo a um médico açougueiro para abortar, e o namorado, muito chateado com o acontecido, nunca mais quisera saber dela. Com remorso pelo que tinha feito e com raiva por ter sido abandonada pelo homem que amava, resolveu ficar sozinha e nunca mais ter homem algum. Depois, já idosa, resolveu ficar no asilo, para ter alguém que cuidasse dela.
Enquanto falava, puxou de uma bolsinha uma foto sua com um homem, e entregou-me na mão, dizendo - esse é o meu grande amor – e citou o nome completo do homem. Para meu espanto, era o nome do meu avô. Fiquei calado para não assustá-la.
Chegando em casa, telefonei para o meu avô e contei o que tinha acontecido. Falei o nome da velhinha e ele confirmou o ocorrido, acrescentando que iria comigo na próxima visita, para vê-la e saber como ela estava.
Na semana seguinte, quando cheguei ao asilo, para não perder o hábito a velhinha retirou-se para o quarto, antes mesmo de ver que eu estava acompanhado - fui até lá e falei que tinha trazido um presente. Ela arregalou os olhos de surpresa. Pedi ao meu avô para entrar e ela, no momento em que o viu, começou a chorar e correu para abraçá-lo. Deixei os dois emocionados ali, conversando, e fui falar com os outros velhinhos.
Dois dias após a visita do meu avô, ela nos deixou.
Descobri, mesmo sem ter tido muito contato com ela, que era uma excelente pessoa e que poderia ter sido a minha avó. E descobri mais: que eu tinha dado a ela o melhor presente de todos - a visita do meu avô, seu grande amor.
Emocionado, eu disse que me sentia orgulhoso por me parecer com seu filho, mas ela disse que eu não me parecia com ele, pois ele não chegara a nascer, mas que eu era exatamente como ela desejaria que ele fosse, caso ela o criasse - um bom homem.
Senti-me mais emocionado ainda, e perguntei se ela queria conversar sobre o assunto. Ela respondeu que não tinha muito a falar, apenas que namorara um homem do qual engravidara. Com medo dos pais, fizera uma bobagem, recorrendo a um médico açougueiro para abortar, e o namorado, muito chateado com o acontecido, nunca mais quisera saber dela. Com remorso pelo que tinha feito e com raiva por ter sido abandonada pelo homem que amava, resolveu ficar sozinha e nunca mais ter homem algum. Depois, já idosa, resolveu ficar no asilo, para ter alguém que cuidasse dela.
Enquanto falava, puxou de uma bolsinha uma foto sua com um homem, e entregou-me na mão, dizendo - esse é o meu grande amor – e citou o nome completo do homem. Para meu espanto, era o nome do meu avô. Fiquei calado para não assustá-la.
Chegando em casa, telefonei para o meu avô e contei o que tinha acontecido. Falei o nome da velhinha e ele confirmou o ocorrido, acrescentando que iria comigo na próxima visita, para vê-la e saber como ela estava.
Na semana seguinte, quando cheguei ao asilo, para não perder o hábito a velhinha retirou-se para o quarto, antes mesmo de ver que eu estava acompanhado - fui até lá e falei que tinha trazido um presente. Ela arregalou os olhos de surpresa. Pedi ao meu avô para entrar e ela, no momento em que o viu, começou a chorar e correu para abraçá-lo. Deixei os dois emocionados ali, conversando, e fui falar com os outros velhinhos.
Dois dias após a visita do meu avô, ela nos deixou.
Descobri, mesmo sem ter tido muito contato com ela, que era uma excelente pessoa e que poderia ter sido a minha avó. E descobri mais: que eu tinha dado a ela o melhor presente de todos - a visita do meu avô, seu grande amor.
Amém
Marcos Toledo
Marcos Toledo
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